O impacto do futebol nos índices de suicídios
- 01/02/2022
O motivo pelo qual as pessoas cometem suicídio preocupa os sociólogos desde os primórdios da sociologia. Em 1897 Émile Durkheim, publicou seu estudo Suicide. Nele Durkheim demonstrou que quando as pessoas perdem sua ligação com a sociedade por causa de uma mudança súbita, elas algumas vezes se matam. Durkheim concluiu que esta forma específica de suicídio "resulta da carência de regulação de atividades do homem e do consequente sofrimento".
Algumas décadas depois os sociólogos começaram a especular se os sofrimentos do homem poderiam estar relacionados aos esportes. Neste sentido, tomamos por base os dados apresentados pelo estatístico Nick Dessypris, que descobriu que em quase todos os países europeus sobre quais tinha números, menos pessoas se matam quando a seleção nacional de futebol está disputando uma Copa do Mundo ou um campeonato europeu. Dessypris disse que as quedas eram "estatísticamente relevantes" - dificilmente devidas ao acaso.
Tomemos a Alemanha, um dos países do estudo, além de sempre se classificar para grandes torneios. Oficialmente na Alemanha de 1991 a 1997 registrou cerca de 90.000 casos de suicídio. Os meses com mais suicídios eram março e junho. Porém quando a seleção alemã disputava um torneio de futebol - como nos meses de junho de 1992, 1994 e 1996 - menos pessoas morriam. Em média, nos meses de junho em que haviam campeonatos, foram registrados 787 suicídios de homens e 329 de mulheres. Muito mais pessoas se matavam nos meses de junho de 1991, 1993, 1995 e 1997, quando a Alemanha não estava jogando. Nesses meses houve uma média de 817 suicídios de homens e 343 de mulheres, ou seja, trinta homens e quatorze mulheres a mais. Nesta amostra de 1991 a 1997, o mês de junho com menor índice de suicídios, foi do ano de1996, mês que a Alemanha venceu a Eurocopa/96.
Em outros países o efeito salva-vidas do futebol foi algumas vezes espetacular. Na Noruega, por exemplo, a média de suicídios dos sete meses de junho em que o país não estava jogando, foi de 55 casos. Porém em junho de 1994, no qual o país participou da Copa do Mundo de 1994, a média de suicídios caiu para 36 casos.
George Masterton, psiquiatra de Edimburgo/Escócia, estudou com J.A. Strachan o número de pessoas que procuravam o Royal Edimburgh Hospital com emergências psiquiátricas durante e depois das Copas do Mundo de futebol de 1978, 1982 e 1986. Os pesquisadores descobriram "reduções de todas as categorias de doenças durante e depois do torneio (com exceção do alcoolismo durante a competição)". Houve, por exemplo, uma redução de 56% nas admissões de neuróticos do sexo masculino nas semanas posteriores ao torneio.
Os autores tentaram explicar o que estava acontecendo: "Há poucas coisas que permitem uma ampla e aceitável expressão no nacionalismo escocês - o esporte é talvez a mais poderosa, e o (futebol) é o esporte nacional. (...) Diríamos que tais interesses e esforços comuns, somados a um surto de nacionalismo, poderiam aumentar a coesão social de forma proposta por Durkheim para explicar a redução dos índices de suicídios que acompanham tempos de guerra".
Por fim, "coesão social" talvez seja a expressão-chave. É o benefício oferecido a quase todos os torcedores - suicidas potenciais e o restante de nós. Ganhar ou perder não é o importante. Perder partidas não deixa um número significativo de pessoas tão infelizes a ponto de cometerem o suicídio. A "união" e a sensação de pertencimento salva as pessoas do suicídio, não a vitória. Parte do sentido de acompanhar uma Copa do Mundo é que quase todas as pessoas fazem o mesmo. Pessoas isoladas - mesmo com ideações suicidas - de repente são bem-vindas nas conversas nacionais (usam a camisa do time, assistem jogos, se emocionam, vibram, conversam, ...). Elas ganham coesão social.
Por João Alexandre
Referência: SOCCERNOMICS
Imagens: Internet